Por Dom Williamson
Número DCCCXXXVI (836) – 22 de julho de 2023
DOIS TIPOS DE BISPO – II
Diz-se que não se pode mudar as manchas do leopardo…
Roma está em mãos inimigas… Basta ligar os pontos!
“Tempora mutantur, nos et mutamur in illis”, diziam os latinos. Em português, “Os tempos mudam, e nós mudamos com eles”. E já que Deus criou todo esse nosso mundo para povoar Seu Céu com anjos e seres humanos merecedores de compartilhar de Sua bem-aventurança eterna; e já que para castigar a Queda de Adão e Eva Ele permitiu que o maior dos anjos caídos se tornasse “o Príncipe deste mundo” (João XII, 31; XIV, 30; XVI, 11); e uma vez que o mundo, a carne e o Diabo juntos criam uma poderosa corrente que arrasta um grande número de almas para sua perdição eterna; então cada um de nós deve ter certeza de que, com o passar do tempo, podemos estar de fato mudando, mas em direção a Deus, e não para longe d’Ele.
Ora, o Vaticano II (1962-1965) é um exemplo catastrófico de milhões de católicos se afastando de Deus mesmo sob a aparência de estarem sendo conduzidos a Ele. E o engano massivo continua. Assim, em meio à grande decadência da Igreja Católica após o Vaticano II, o Arcebispo Lefebvre (1905-1991) realizou a façanha milagrosa de criar dentro da Igreja uma congregação sacerdotal para opor-se à decadência imposta a toda a Igreja por seus mais altos responsáveis em Roma e nas dioceses. Esta foi a Fraternidade Sacerdotal São Pio X, oficialmente condenada na aparência pela hierarquia, dos Papas para baixo, mas, na realidade, mantendo a verdadeira Fé com a graça de Deus e com o apoio de uma remanescência de verdadeiros católicos em todo o mundo. Para salvar Sua Fraternidade e proteger esses católicos, em 1988 o Arcebispo se viu obrigado, contra a proibição expressa de Roma, a consagrar quatro Bispos seus, que por duas décadas prestaram, pelo menos exteriormente, um serviço fiel à Verdade Católica e, portanto, à Igreja.
Interiormente, porém, os tempos estavam mudando, e com eles estavam mudando os líderes da Fraternidade que o Arcebispo havia deixado para trás quando faleceu em 1991. Em poucos anos, os contatos entre a Fraternidade e Roma – que o Arcebispo havia interrompido em 1988 até que, segundo ele, “Roma retornasse à fé católica” – foram sendo discretamente, para não dizer secretamente, renovados, embora Roma estivesse impondo cada vez mais a falsa “renovação” conciliar. A discrição ou o sigilo desses contatos era necessária para não afugentar as almas de nenhum dos lados que – com toda a razão – não podiam acreditar que catolicismo e conciliarismo pudessem conciliar-se. Foi preciso dar tempo a essas almas de ambos os lados para que mudassem o suficiente para aceitar que não haveria contradição irreconciliável entre a Fé e o Vaticano II.
E, de fato, os homens mudaram com o tempo, e, em 2012, os líderes da Fraternidade estavam pelo menos prontos para negar a contradição. E assim, em seu Capítulo não eletivo daquele ano, eles mudaram oficialmente a política de seu fundador que se baseava em “nenhum acordo prático sem um acordo doutrinário”, o que coloca a Fé em primeiro lugar, para uma política de “não pode haver acordo doutrinário, então devemos contentar-nos com um acordo prático”, o que coloca a doutrina em segundo lugar e o acordo em primeiro lugar, algo que o próprio Arcebispo, depois de 1988, nunca teria feito. Pois, como se disse nestes “Comentários” da semana passada, nas negociações com Roma em maio de 1988, Dom Lefebvre considerou que a prevaricação do Cardeal Ratzinger havia mostrado de uma vez por todas que Roma não protegeria a Tradição.
Mas, alguém poderia objetar: o que há de errado com um acordo prático quando um acordo doutrinário prova ser impossível, como ficou claro após as infrutíferas discussões doutrinárias entre Roma e a FSSPX de 2008 a 2011? O que está errado é aquilo que o velho Arcebispo compreendia bem: que a partir de qualquer acordo prático, a leve Fraternidade teria se amarrado à pesada Roma, e o único peso verdadeiro da Fraternidade, sua doutrina da Verdade, ter-se-ia desvanecido, até que fosse virtualmente abandonada, e a Fraternidade seria anulada, como a Roma infiel, a Roma conciliar, sempre desejou.
Certamente o Dom Huonder, com toda a sua boa vontade possível – Só Deus sabe – está sendo preparado em 2023 por ambas as partes para dar uma contribuição significativa para essa anulação – Só Deus sabe.
Kyrie eleison.